\ A VOZ PORTALEGRENSE: Crónica de Nenhures

quinta-feira, abril 23, 2009

Crónica de Nenhures

Quando nem os Sinos dobram
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A mim, Portalegrense exilado, só me resta o suicídio como forma de me redimir por todo o progresso no qual não participei e por todo o obscurantismo do qual sou seguramente responsável.
Em Portalegre o medo mora atrás dos cantos e das palavras.
A cidade é sórdida no quebranto que nos tolhe a vontade e nos faz recordar as noites lúgubres e inquisitoriais repletas de almas do outro mundo.
Pior só mesmo a Sicília com toda a sua organização clandestina e criminosa, e nem o Vento Suão consegue superar o cheiro dos jasmins de Palermo.
José Corvo
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Quando no mês da Feira das Cebolas do ano setenta do século passado Carlos Garcia de Castro escreveu o poema “Os Sinos de São Lourenço”, ainda havia a Feira das Cebolas e ainda dobravam os sinos da Igreja de São Lourenço. Hoje, tudo já é nada!
A Feira das Cebolas já não tem existência física, enquanto há anos que os sinos da igreja paroquial de São Lourenço não tocam e estão em risco de cair e as torres sineiras de derrocada.
O toque a finados de que fala o poeta Carlos Garcia de Castro já não se ouve, mas a Morte entrou em Portalegre e não quer ir-se embora. Morreu a Arte dos Lanifícios, cuja primeira referência histórica data do tempo do luto pelo rei morto em Alcácer-Quibir. Morre todos os dias a Arte do Comércio, cujos símbolos, a Rua 5 de Outubro e a Rua do Comércio, estão moribundos. Morta está a Arte da Cortiça, a Corticeira Robinson vai fechar. Morto está o Rossio, aquele espaço que era a Ágora da Polis. Morto está o Mercado Municipal, porque as hortas que circundavam a cidade morreram. Nado-morto é a Escola de Hotelaria e Turismo.
Mortos estão os Portalegrenses, que não encontram estimulo para lutarem contra o Mal que assola a cidade e o concelho.
Os grandes responsáveis pelo que de Mau acontece em Portalegre são o Partido Socialista e o Partido Social Democrata. Juntos têm mais de dois terços dos votos. Tudo controlam, em tudo entram, não para servir a Comunidade, mas sim para servirem os interesses partidários e quantas vezes os pessoais.
Em Portalegre não há verdadeira alternância democrática. Seria normal que o partido vencedor ocupasse os lugares de nomeação política. Contudo, em Portalegre há, independentemente do vencedor, uma partilha dos lugares, em que apenas muda a chefia, que é entregue rotativamente ao partido vencedor, mas os quadros intermédios permanecem indefinidamente. PS e PSD dividem entre si o que há a dividir, sejam colectividades culturais, desportivas ou de solidariedade social, sejam lugares públicos.
O Grande Centrão é quem manda em Portalegre, os aparelhos do PSD e do PS distribuem o que há a distribuir pelos seus militantes. O cartão do partido é que dá emprego, que em Portalegre apenas existe no sector público, lugares de mando e mordomias de toda a ordem.
Hoje há duas classes sociais em Portalegre, os militantes do PS e do PSD, e os outros. Os primeiros são 'cidadãos de primeira', os outros 'cidadãos de segunda'. Assiste-se em Portalegre a existência de uma nomenklatura de tipo soviético, composta pelos militantes do Centrão. Nela há estratos bem definidos, cada um sabe até onde pode ir, ao que pode ascender, como deve agir, a quem deve obedecer.
E o Povo de Portalegre tudo vê e cala. E consente!
Mário Casa Nova Martins